terça-feira, julho 15, 2014

Rien de rien



Um estudo norte-americano de psicologia, recentemente divulgado na revista Science, informou que, num universo de 200 pessoas entre os 18 e os 77 anos, a maioria preferiu desenvolver uma actividade qualquer, que até podia ser a auto-aplicação de indolores e ligeiros choques elétricos, a submeter-se a uma experiência de não fazer nada. Esta consistia no pretenso objectivo de os participantes ficarem fechados numa sala ou casa vazia e se dedicassem à arte de pensar. O tempo proposto foi de um período entre 6 e 15 minutos. Um significativo número de voluntários preferiu fazer algo, como ouvir música ou utilizar o smartphone. De realçar que não terá havido diferenciação de resultados entre os habituais utilizadores de aparelhos electrónicos e de redes sociais e os outros participantes. Uma cientista sugeriu até que a “obsessão” com este tipo de experiências são uma consequência e não uma causa. Ou seja, o efeito é a utilização de meios externos para, eventualmente, nos dissociarmos da possibilidade de nos questionarmos da raiz do problema interior. 
A sociedade actual recompensa quem faz várias coisas ao mesmo tempo, razão pela qual o exercício de concentração (introspecção, meditação) nem sempre é visto como algo benéfico. O vazio, o silêncio, a serenidade são, de alguma forma, ameaçadores, tal como tudo o que é desconhecido. Há menor risco em nos envolvermos no e sobre o que já pensamos conhecer. Se me fizer muitas e complicadas perguntas, sei lá eu o que vou encontrar? Paralelamente a paciência não é requisito que, habitualmente, seja considerado. Os resultados a curto prazo são mais facilmente reconhecidos do que os de longo prazo, embora estes sejam, genericamente, bem mais satisfatórios. O que obtemos a longo prazo é consequência de muitas e frequentes acções durante um significativo período de tempo.    

O simples facto de estar atento à forma como habitualmente nos comportamos, permite constatar que a generalidade das pessoas dá prioridade à urgência dos assuntos desvalorizando a importância de outros interesses. Quantas vezes por dia podemos ouvir “não tenho tempo” e alguns até anunciam que “se dão muito bem em situações de stress”. Nenhuma destas perspectivas, bem como outras semelhantes, se anunciam como indicadores salutares. Antes pelo contrário! No entanto, por que razão há tanta gente a insistir no mesmo?
Desde crianças que o apelo à acção é uma realidade. De tal forma que a gestão energética do nosso organismo vai no sentido de o desperdício ser evitado. No entanto, sabe-se hoje que o consumo do recurso energia, tão fundamental para o ser humano, é muito mais significativo quando é utilizada a capacidade cognitiva do que a física. Talvez por isso, culturalmente e durante décadas, o mundo ocidental tenha estado distraído de temas tão relevantes como aquele que nos foram revelados pelos antigos filósofos gregos. Já lá vão 2500 anos! A famosa frase de Sócrates é disso exemplo quando expressa a humildade de não se conhecer a si próprio: “só sei que nada sei!”.
Colocar-nos em causa não é fácil. Há que hierarquizar valores, convicções, compreender estados de espirito, refletir sobre regras comportamentais. Isto tudo a nível individual, de modo a que possamos encarar a nossa identidade. Contudo, é bem diferente o “não fazer nada” da experiência supra mencionada ao que pode resultar do alheamento, acomodamento ou evitamento relacionado com a recomendável tomada de decisão sobre um qualquer assunto que requer solução. Vivemos na ilusão de que resolvemos todos os nossos problemas através das reacções que temos junto de quem ou sobre o que nos rodeia, quando a solução é mesmo apercebermo-nos de que essas mesmas atitudes são reflexo de questões deficientemente equacionadas por nós mesmos. As sensações negativas que possam surgir de determinada ocorrência não são aplicáveis à própria experiência, mas antes à interpretação que, cada um de nós, faz da mesma. Com inusitada frequência nos concentramos no efeito desprezando a causa. O que pode estar na origem da minha irritação, frustração? Bem vistas as coisas, não faz sentido que seja o comportamento da outra pessoa. Mas no imediato, não é bem assim que a maioria interpreta o assunto.    
O que poderá provocar uma inquietude do ser humano durante um período de tempo tão curto como o relatado na experiência supra mencionada e uma passividade generalizada quando dá “de caras” com a necessidade de corresponder aos seus revelados anseios?
Há diferença na interacção que tem com os outros e com a que tem consigo?